sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
Movimento por um Brasil literário
Belo Horizonte, 16 de dezembro de 2009
Hoje, me vi pensando como seria viver em um país de leitores literários. Pode ser apenas um sonho, mas estaríamos em um lugar em que a tolerância seria melhor exercida. Praticar a tolerância é abrigar, com respeito, as divergências, atitude só viável quando estamos em liberdade. Desconfio que, com tolerância, conviver com as diferenças torna-se em encantamento. A escrita literária se configura quando o escritor rompe com o cotidiano da linguagem e deixa vir à tona toda sua diferença – e sem preconceitos. São antigas as questões que nos afligem: é o medo da morte, do abandono, da perda, do desencontro, da solidão, desejo de amar e ser amado. E, nas pausas estabelecidas entre essas nossas faltas, carregamos grande vocação para a felicidade. O texto literário não nasce desacompanhado destes incômodos que suportamos vida afora. Mas temos o desejo de tratá-los com a elegância que a dignidade da consciência nos confere.
A leitura literária, a mim me parece, promove em nós um desejo delicado de ver democratizada a razão. Passamos a escutar e compreender que o singular de cada um – homens e mulheres – é que determina sua forma de relação. Todo sujeito guarda bem dentro de si um outro mundo possível. Pela leitura literária esse anseio ganha corpo. É com esse universo secreto que a palavra literária quer travar a sua conversa. O texto literário nos chega sempre vestido de novas vestes para inaugurar este diálogo, e, ainda que sobre truncadas escolhas, também com muitas aberturas para diversas reflexões. E tudo a literatura realiza, de maneira intransferível, e segundo a experiência pessoal de cada leitor. Isto se faz claro quando diante de um texto nos confidenciamos: "ele falou antes de mim", ou "ele adivinhou o que eu queria dizer".
O texto literário não ignora a metáfora. Reconhece sua força e possibilidade de acolher as diferenças. As metáforas tanto velam o que o autor tem a dizer como revelam os leitores diante de si mesmo. Duas faces tem, pois, a palavra literária e são elas que permitem ao leitor uma escolha. No texto literário autor e leitor se somam e uma terceira obra, que jamais será editada, se manifesta. A literatura, por dar a voz ao leitor, concorre para a sua autonomia. Outorga-lhe o direito de escolher o seu próprio destino. Por ser assim, a leitura literária cria uma relação de delicadeza entre homens e mulheres.
Uma sociedade delicada luta pela igualdade dos direitos, repudia as injustiças, despreza os privilégios, rejeita a corrupção, confirma a liberdade como um direito que nascemos com ele. Para tanto, a literatura propõe novos discernimentos, opções mais críticas, alternativas criativas e confia no nosso poder de reinvenção. Pela leitura conferimos que a criatividade é inerente a todos nós. Pela leitura literária nos descobrimos capazes também de sonhar com outras realidades. Daí, compreender, com lucidez, que a metáfora, tão recorrente nos textos literários, é também uma figura política.
Quando pensamos em um Brasil Literário é por reconhecer o poder da literatura e sua função sensibilizadora e alteradora. Mas é preciso tomar cuidados. Numa sociedade consumista e sedutora, muitos são leitores para consumo externo. Lêem para garantir o poder, fazem da leitura um objeto de sedução. É preciso pensar o Brasil Literário com aquele leitor capaz de abrir-se para que a palavra literária se torne encarnada e que passe primeiro pelo consumo interno para, só depois, tornar-se ação.
O Brasil Literário pode, em princípio, parecer uma utopia, mas por que não buscar realizá-la?
Com meu abraço, sempre,
Bartolomeu Campos de Queirós
sábado, 20 de novembro de 2010
Rachel de Queiroz em uma lição
TEXTO ESCRITO POR SOCORRO ACIOLI
"Ninguém é de todo bom, nem de todo mau”, disse Rachel de Queiroz, exatamente com essas palavras, na última entrevista que me concedeu, em agosto de 2002. Foram vários depoimentos entre 1998 e 2002, colhidos para a escrita de sua biografia, publicada em 2003. De tantas conversas, algumas frases em especial calaram em mim. Essa foi uma delas.
Na ocasião conversávamos sobre suas personagens, tema provocado pela pergunta de uma mocinha de pouco mais de 15 anos, de caderno nas mãos, esboçando uma entrevista para um trabalho escolar.
- A Conceição do livro “O Quinze” é a senhora mesmo? – perguntou, com a inocência e alegria dos seus poucos anos.
Rachel respondeu que não, as coisas não funcionam assim na literatura. Explicou que personagens não são espelhos do autor, mas criações artísticas. São feitos de retalhos de lembranças, pedaços dali e de acolá, mas não surgem, nunca, como reflexos perfeitos e absolutos do seu criador. Contou que os bons personagens são como nós, cheios de facetas, máscaras, mistérios, bondades, medos... e conflitos.
Compreendi, então, que parte da maestria de Rachel de Queiroz como escritora estava no domínio da criação de personagens notadamente humanos, tão próximos do que somos de verdade quanto os que moram na casa ao lado, pertíssimo do nosso mundo. Amamos Maria Moura, por exemplo, porque sabemos que sua valentia é filha do medo, conhecemos o seu desejo secreto de amar, sabemos que ela não é forte por inteiro. Fazemos parte, como leitores, de suas horas de fraqueza. Perdoamos os seus erros, porque ela é como nós, dividida, sempre, entre dois caminhos possíveis, de destinos, chapinhando em terreno obscuro.
É parte da condição humana: somos construídos pela matéria da dúvida, moldados pela ambiguidade. Assim também era Rachel de Queiroz. Ateia declarada que vivia sob os olhos de santos e anjos da sua coleção de arte sacra. Apaixonada pelo Ceará, mas que deixou a terra natal na primeira oportunidade, em nome da sua profissão - que ela respeitava acima de tudo. Conversava sobre política com a mesma destreza com que preparava uma panela de doce. Gostava de luta livre e bordados. Amava o burburinho do centro do Rio de Janeiro e o silêncio do açude do sertão. Tudo cabia no mesmo coração.
Talvez a maior lição de Rachel de Queiroz – ainda não compreendida em sua totalidade, certamente – tenha sido ensinar que somos nada mais que um produto de nossas contradições. E que não é justo, muito menos possível, exigir perfeição de seres tão falíveis e, por isso mesmo, encantadores.
“Ninguém é de todo bom, nem de todo mal”, ela disse. A condição humana nos faz assim. Louvados sejam os cem anos de Rachel de Queiroz. Não a louvaríamos hoje com tanto clamor se não houvesse, na sua vida e obra, essa indecifrável e plena humanidade.
Socorro Acioli - Escritora, Doutoranda em Estudos de Literatura pela Universidade Federal Fluminense e autora do ensaio biográfico “Rachel de Queiroz” publicado pelas Edições Demócrito Rocha: socorroacioli@gmail.com
sábado, 16 de outubro de 2010
Homenagem aos professores (lindo texto de Paulo Freire)
REFLETINDO SOBRE O ATO DE APRENDER
Aprender não é acumular certezas
Nem estar fechado em respostas
Aprender é incorporar a dúvida
E estar aberto a múltiplos encontros
Aprender não é dar por consumada uma busca
Aprender não é ter aprendido
Aprender não é nunca um verbo do passado
Aprender não é um ato findo
Aprender é um exercício constante de renovação
Aprender é sentir-se humildemente sabedor de seus limites, mas com a coragem de não recuar diante dos desafios
Aprender é debruçar-se com curiosidade sobre a realidade
É reinventá-la com soltura dentro de si
Aprender é conceder lugar a tudo e a todos
E recriar o próprio espaço
Aprender é reconhecer em si e nos outros o direito de ser dentro de inevitáveis repetições porque aprender é caminhar com seus pés um caminho já traçado
É descobrir de repente uma pequena flor inesperada
É aprender também novos rumos onde parecia morrer a esperança
Aprender é construir e reconstruir pacientemente
Uma obra que não será definitiva porque o humano é transitório
Aprender não é conquistar nem apoderar-se mas peregrinar
Aprender é estar sempre caminhando, não é reter mas comungar.
Tem que ser um ato de amor para não ser um ato vazio.
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Só é pobre quem não trabalha (ou Guerreiro Menino)
No Brasil, as coisas sempre ganham sentidos múltiplos e interpretações duvidosas. É incrível nossa capacidade de criar frases engraçadas, às vezes, fortes, mas sempre com um tom de ironia. Assim é o povo brasileiro!
Quando o assunto é trabalho, aí então surgem as paródias, letras de sambas que fazem o maior sucesso quando se reúnem os amigos; vale tudo quando é para levar a brincadeira a sério...
Outro dia eu viajava de ônibus pela Ponte Rio-Niterói e escutava a conversa de dois homens que discutiam o momento econômico do país, a partir de suas próprias experiências profissionais.
Um deles, depois de se entregar de corpo e alma durante trinta anos ao emprego numa multinacional, aceitara recentemente aderir ao pacote de vantagens oferecido para sua demissão voluntária. Dizia-se aliviado, menos estressado, pensava em abrir um negócio no ramo de alimentação. Seu companheiro de viagem, menos afortunado, entusiasmado no entanto, contava os dias para voltar à sua terra natal, o Ceará.
Severino, no alto de seus sessenta anos, dizia-se feliz por ter vivido no Rio de Janeiro durante quarenta anos, trabalhando em obras e mais obras, de sol a sol. Queria rever sua família, justamente agora que chegara à conclusão que não conseguiria ficar rico. E ria, ria muito da própria situação, como se quisesse gritar para todos ouvirem “olha, gente, não adianta correr, se matar de trabalhar, porque seremos sempre pobres...”
Fiquei pensando no significado das palavras, dos adjetivos; o que seria uma pessoa rica, o que seria uma pessoa pobre? Afinal, trabalhar muito, ou trabalhar pouco, faz alguma diferença?
A única resposta que me vem à cabeça são aqueles lindos versos cantados pelo Fagner (acho que é poesia do Gonzaguinha) na música “Guerreiro Menino”, com os seguintes versos:
Seu sonho é sua vida
E a vida é trabalho
E sem o seu trabalho
Um homem não tem honra
E sem a sua honra
Se morre, se mata
Não dá pra ser feliz
Viver é uma arte, seja rico, seja pobre, o importante é valorizar cada novo dia, cada nova oportunidade de vencer pelo próprio esforço, conquistando a felicidade no sorriso do nosso irmão mais próximo. Viva o povo brasileiro!
Texto de Ilcimar Abreu
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
Ferreira Gullar recebe o Prêmio Camões
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Fórum Internacional do Livro Digital reúne três dos principais especialistas na área
Questões como o impacto da nova tecnologia no mercado livreiro, as novas plataformas de publicação e edição, as possibilidades de conteúdo e os direitos autorais têm entrado na pauta de debates de editores, autores e distribuidores de livros e vêm ganhando espaço na mídia especializada. Para aprofundar essa discussão, a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e a Câmara Brasileira do Livro (CBL) irão realizar, nos dias 10 e 11 de agosto (terça e quarta-feira da próxima semana), o Fórum Internacional do Livro Digital, com palestras de Mike Shatzkin, John B. Thompson e Jean Paul Jacob. O encontro acontece no Auditório Elis Regina, no Parque Anhembi - Av. Olavo Fontoura, 1209.
Fundador e CEO da The Idea Logical, empresa que assessora editoras de livros a se adaptarem ao formato digital, e especialista do mercado de livros, Shatzkin falará no dia 10, às 20 horas, do tema “O futuro do livro impresso num mundo digital”. Ele mantém o blog Shatzkin Files (http://idealog.com/blog), sobre o livro digital.
No dia 11, às 8h30, será a vez de Thompson palestrar sobre “Os livros na era digital”. Ele é professor de sociologia da Universidade de Cambridge e publicou os livros “Ideologia e Cultura Moderna”, “A Mídia e a Modernidade”, “Escândalo Político” e “Livros na Era Digital”.
No mesmo dia, às 18 horas, Jacob fará a palestra “O futuro já não é mais o que era!”. Brasileiro, ele se formou em engenharia eletrônica pelo Instituto de Tecnologia e Aviação (ITA) e tem duplo Ph.D. em Matemática e Engenharia, na Universidade de Califórnia, Berkeley. Considerado guru do mundo digital, Jacob é pesquisador emérito da IBM e cientista consultor na Universidade da Califórnia.
Confira a programação completa
Dia 10 de agosto (terça-feira)
19 horas: Coquetel de abertura.
20 horas: Palestra “O futuro do livro impresso num mundo digital”, com Mike Shatzikin.
Dia 11 de agosto (quarta-feira)
8h30: Palestra “Os livros na Era Digital”, de John B. Thompson.
18 horas: Palestra “O Futuro já não é mais o que era!”, com Jean Paul Jacob.
Esta é a segunda vez em 2010 que a Imprensa Oficial e a CBL promovem um evento sobre o livro digital. Em março deste ano, organizaram, em conjunto com a Frankfurter Buchmesse, o I Congresso Internacional do Livro Digital, evento que reuniu, durante três dias, alguns dos principais nomes mundiais da área em palestras e debates.
Na ocasião foi apresentada uma pesquisa qualitativa, encomendada pela Imprensa Oficial e CBL, realizada com oito grupos de leitores de livros sobre seus hábitos de leitura e o que se pode esperar para o futuro próximo em relação ao livro digital no Brasil. Os resultados mostraram que, apesar da falta de conhecimento, a maior parcela dos entrevistados aposta que a funcionalidade do e-reader será um fator decisivo para vencer em curto prazo a resistência atual em relação ao formato. Os resultados indicaram ainda que o consumidor brasileiro não está disposto a pagar pelo livro digital. Nas respostas, o raciocínio utilizado é o mesmo para o download de músicas e que acaba gerando pirataria: se está na internet, deve ser gratuito.
sábado, 17 de julho de 2010
A bola e o livro
"A má distribuição de renda no país, os megapatrocínios, a idolatria constante na nossa cultura fazem surgir pessoas despreparadas para o uso de tanto dinheiro, enquanto escolas despencam, hospitais deixam de atender ao mais simples diagnóstico, aposentados choram pelo minguado aumento. Até quando isto vai continuar? A sociedade já não suporta ver estes "ídolos" na mídia. Por que os salários não são igualitários? Por que se concedem altos aumentos na política? Por que alguns artistas ganham a peso de ouro? Por que jogadores ganham tanto dinheiro e poder sem ter ficado nos bancos escolares? Por que tanto interesse das empresas em patrocinar estes jogadores? Será que uma bola é mais valiosa que um livro?"
(Carta escrita por Maria Marta Nascimento Cardoso, publicada no Jornal O Globo em 11 de julho de 2010)
domingo, 27 de junho de 2010
Machado de Assis: leituras dramatizadas na ABL Rio começam dia 5 de julho
A Academia Brasileira de Letras convida para a abertura do Ciclo Leituras Dramatizadas, sobre o tema "Dramaturgias de Machado de Assis", com o Grupo Dramaturgia de Sempre.
A primeira série de eventos será as leituras de novos textos da “Dramaturgia de Machado de Assis”, a partir da perspectiva adotada pelo Ciclo de que a sua obra deve ser continuamente reapresentada aos jovens, tornando-a familiar aos potenciais novos leitores do autor.
A leitura a ser realizada será "O Protocolo", com apresentação no dia 5 de julho, às 15h, no Teatro R. Magalhães Jr., com entrada franca.
O evento tem a coordenação geral de Sílvia Eleutério e a produção de Márcia Kaskus.
Para o público infanto-juvenil: as escolhas que fazemos
A MENINA MARCA-TEXTO
Isabela Domingues – Editora Calibán - 54 páginas – R$ 25,00
A Menina Marca-Texto conta as aventuras de uma garota curiosa em busca de um livro especialíssimo dentro de uma biblioteca. Uma história sobre as escolhas que fazemos o tempo todo e demonstram o que é, na verdade, importante para cada um de nós. Com uma linguagem envolvente, ilustrações bem-humoradas e uma narrativa superdinâmica, a autora é capaz de despertar nos leitores de todas as idades a reflexão sobre seus próprios valores e atitudes.
segunda-feira, 21 de junho de 2010
Recomendado lançamento de Maria Helena de Moura Neves
A Editora Contexto acaba de lançar "Ensino de língua e vivência de linguagem", escrito pela professora Maria Helena de Moura Neves, grande referência nos estudos da língua portuguesa. O livro tem 288 páginas e custa R$ 35,00.
Apresentação da obra pela Editora:
No Brasil, infelizmente ainda temos a absurda visão de que a gramática constitui um conjunto de esquemas isolado e autônomo, a que o aluno tem de simplesmente ser apresentado, para irrefletidamente se entregar à sua catalogação.
Neste livro, a professora Maria Helena de Moura Neves mostra a gramática da língua como a responsável pela produção de sentido na linguagem, pelo entrelaçamento discursivo-textual das relações estabelecidas na sociocomunicação. Ao longo de treze capítulos, a autora elucida a visão da linguagem confrontada com a realidade da língua e qual o lugar da gramática na escola. Um equilíbrio coeso entre teoria e sua aplicação na prática. Pois é necessário ter atenção às modalidades falada e escrita da língua bem como à pertinência de estudos do português falado sob um aparato teórico.
Ensino de língua e vivência de linguagem: temas em confronto se destina a todos os que se interessam por uma proposta escolar de tratamento da gramática que não se isole da vivência da linguagem, que ponha em estudo, realmente, a gramática da língua em função. Leitura imprescindível a professores, pedagogos e estudantes.
sábado, 29 de maio de 2010
A Era do Radioteatro é um registro histórico
A Era do Radioteatro é uma obra não só para aqueles que curtiram as novelas e os programas humorísticos como também para quem quer conhecer uma época pujante do nosso rádio, que arrebatava emoções e que fazia o Brasil vibrar.
Em suas 340 páginas o leitor vai se deparar com histórias deliciosas, depoimentos e fotos de época, além de relembrar os comerciais de anunciantes e morrer de rir com as radiocacetadas (as gafes protagonizadas pelos atores num tempo em que tudo ia pro ar ao vivo).
O livro conta a saga do radioteatro no Rio de Janeiro, desde suas primeiras experiências nos anos trinta até seu declínio nos anos oitenta, mostrando as adaptações pelas quais passou o gênero até nossos dias, desvendando os bastidores e descrevendo como eram os estúdios de radioteatro e a tecnologia empregada na época.
Enfim, trata-se de um registro da história de um gênero que emocionou o Brasil, produto de uma pesquisa feita, durante dez anos, por Roberto Salvador, professor universitário que começou a carreira em rádio, aos 13 anos de idade, em programas da Rádio Nacional, e que chamou para si a responsabilidade de contar essa história.
domingo, 16 de maio de 2010
"Vou contar um segredo" - lançamento
sexta-feira, 12 de março de 2010
Livro é um ser vivo
Estava eu posta em sossego sábado à noite, quando me ligou Pedro Lago, desesperado:
- Já mandou o arquivo do livro para a gráfica?
Eu respondi:
- Sim, claro.
- Ih, encontrei outro erro.
- Onde?
- Na citação de Balzac. Tem um R a mais numa palavra e nós não vimos...
- Esse é um erro fácil de passar, depois de tantos que já pegamos...
O livro passou por três provas de gráfica, fora as duas antes de mandarmos os arquivos para impressão. Mas não adianta: quantos mais erros houver no original, mais tempo levaremos para pegar todos, isto é, se quisermos pegar todos. Pois o olho não funciona como um instrumento de precisão. O olho é vago. Ele vê o que quer e o que ele não quer ver, descarta. Oblitera. Sublima.
Assim, toda revisão tem de ser feita de modo regular, periódico, sistemático e, se possível, por quem nunca tenha visto o livro antes.
- Como você encontrou o erro?
- Pedi a meu amigo para ler a citação em voz alta e aí ele viu que estava errado.
Eu disse:
- Pois é, você acabou de experienciar o livro dizendo para você onde ainda havia um erro. De onde você tirou a ideia de ler justamente a citação?
- Sei lá.
- É assim mesmo que funciona. O livro só pode nos fazer encontrar os erros que passaram por acaso, não tem outro jeito, pois nossa leitura é falha. A não ser que tenhamos todo o tempo todo mundo. Mas queremos ver o livro pronto, por isso não temos paciência para esperar.
- Entendi...
Pedro acabava de viver na pele como isso acontece. Pode ser que algum outro errinho tenha escapado. Nas sucessivas leituras que fizemos, eu e ele, sempre encontrávamos algo a mais que não tínhamos visto antes. E este (negligenciado por justamente estar logo na frente, e isso é comum) não poderia passar. Desse modo, de forma sutil, o livro indicou onde estava o erro, pedindo: "Leia-me."
Hoje topei com uma citação de Anaïs Nin: "Lemos aquilo que precisamos. Há quase uma força obscura que nos guia para determinado livro".
Isso eu experimento toda vez que entro numa livraria. O livro me "chama", seja lá onde ele estiver na prateleira. Realmente, é uma força estranha que entra em ação, me chamando para o livro onde ele está, debaixo de um, ao lado de outro, meu olhar busca o livro onde ele estiver escondido, e só pára no momento em que o encontra.
É uma mágica que se instala na atração irresistível de um livro chamando seu leitor: "Leia-me", da mesma forma que ele pede para ser corrigido antes de ficar pronto. É um apelo, um grito, uma dor, como se dissesse: "Corrija-me, por favor".
O antes e o depois de um livro ficar pronto cria uma energia elástica, uma sintonia plástica entre aquele que faz o livro e quem o compra para ler. Existe uma tensão entre aquilo que foi escrito e quem precisa lê-lo. E todas as forças entram em ação para que o objeto encontre seu fim, atinja seu destino.
"Lemos o que precisamos". Nem mais, nem menos. Se não sabe o que ler, espere: o livro o encontrará.
Rio de Janeiro, 10 de março de 2010 - 22h10
Texto de Thereza Christina Rocque da Motta
http://ibislibrisbooklog.blogspot.com
- Já mandou o arquivo do livro para a gráfica?
Eu respondi:
- Sim, claro.
- Ih, encontrei outro erro.
- Onde?
- Na citação de Balzac. Tem um R a mais numa palavra e nós não vimos...
- Esse é um erro fácil de passar, depois de tantos que já pegamos...
O livro passou por três provas de gráfica, fora as duas antes de mandarmos os arquivos para impressão. Mas não adianta: quantos mais erros houver no original, mais tempo levaremos para pegar todos, isto é, se quisermos pegar todos. Pois o olho não funciona como um instrumento de precisão. O olho é vago. Ele vê o que quer e o que ele não quer ver, descarta. Oblitera. Sublima.
Assim, toda revisão tem de ser feita de modo regular, periódico, sistemático e, se possível, por quem nunca tenha visto o livro antes.
- Como você encontrou o erro?
- Pedi a meu amigo para ler a citação em voz alta e aí ele viu que estava errado.
Eu disse:
- Pois é, você acabou de experienciar o livro dizendo para você onde ainda havia um erro. De onde você tirou a ideia de ler justamente a citação?
- Sei lá.
- É assim mesmo que funciona. O livro só pode nos fazer encontrar os erros que passaram por acaso, não tem outro jeito, pois nossa leitura é falha. A não ser que tenhamos todo o tempo todo mundo. Mas queremos ver o livro pronto, por isso não temos paciência para esperar.
- Entendi...
Pedro acabava de viver na pele como isso acontece. Pode ser que algum outro errinho tenha escapado. Nas sucessivas leituras que fizemos, eu e ele, sempre encontrávamos algo a mais que não tínhamos visto antes. E este (negligenciado por justamente estar logo na frente, e isso é comum) não poderia passar. Desse modo, de forma sutil, o livro indicou onde estava o erro, pedindo: "Leia-me."
Hoje topei com uma citação de Anaïs Nin: "Lemos aquilo que precisamos. Há quase uma força obscura que nos guia para determinado livro".
Isso eu experimento toda vez que entro numa livraria. O livro me "chama", seja lá onde ele estiver na prateleira. Realmente, é uma força estranha que entra em ação, me chamando para o livro onde ele está, debaixo de um, ao lado de outro, meu olhar busca o livro onde ele estiver escondido, e só pára no momento em que o encontra.
É uma mágica que se instala na atração irresistível de um livro chamando seu leitor: "Leia-me", da mesma forma que ele pede para ser corrigido antes de ficar pronto. É um apelo, um grito, uma dor, como se dissesse: "Corrija-me, por favor".
O antes e o depois de um livro ficar pronto cria uma energia elástica, uma sintonia plástica entre aquele que faz o livro e quem o compra para ler. Existe uma tensão entre aquilo que foi escrito e quem precisa lê-lo. E todas as forças entram em ação para que o objeto encontre seu fim, atinja seu destino.
"Lemos o que precisamos". Nem mais, nem menos. Se não sabe o que ler, espere: o livro o encontrará.
Rio de Janeiro, 10 de março de 2010 - 22h10
Texto de Thereza Christina Rocque da Motta
http://ibislibrisbooklog.blogspot.com
quarta-feira, 27 de janeiro de 2010
Espontaneidade
domingo, 17 de janeiro de 2010
EXCLUSIVO: Leonardo Boff "O ser humano é um projeto infinito"
As palavras de Leonardo Boff nos remete à própria transcendência, pois que é ele a quintessência da fraternidade. Homem, filósofo, pensador, político, todas as dimensões nele cabem. Seu discurso objetiva dar sentido às lutas humanas, levantando bandeiras de preservação ecológica e cuidados com a Mãe Terra, afinal nossa Casa.
Ele espalha esperança, como fazem os poetas. Caminha sem cessar, como fazem os viajantes. Mergulha em nossos espíritos, como fazem os que têm certeza.
Leonardo Boff é um profeta, aquele que antevê e prediz. Intelectual que merece ser lido, ouvido e aplaudido.
Na entrevista exclusiva que concedeu ao “Estação de Palavras”, Boff fala do projeto infinito que é o ser humano, da proliferação de Ong´s, de solidariedade e deixa um recado aos jovens.
EP - Diante de tantas crises por que tem passado o planeta, com índices crescentes de pobreza e exclusão social, como atender as questões de preservação ambiental e sustentabilidade num cenário caótico?
LB - Dentro do modo de produção capitalista não há solução para a crise ecológica. É premissa de toda a acumulação capitalista que se explore todos os recursos naturais, que se faça no tempo mais rápido possível e com o menor investimento que se puder, sem solidariedade para as atuais e as futuras gerações. A questão do atual sistema se resume nisso: como ganhar mais? Esta lógica é destrutiva da Terra. Devemos assumir outras premissas que impliquem respeito pelos limites dos recursos, cuidado para com todas as formas de vida, justiça planetária que permita incluir todos os seres humanos nesta única Casa Comum que temos, obedecendo a este propósito: produzir sim, mas em harmonia com a natureza e com os demais seres humanos. Se não fizermos esta virada, iremos fatalmente ao encontro do pior.
EP - Como encara a proliferação de Ong´s por todo o país? Quais são hoje os maiores desafios dentro do contexto social de violência e discriminação em que vivemos?
LB - As ONGs nasceram e nascem por causa da insuficiência de representatividade por parte dos partidos e pelo fato de que o Estado sozinho não dá conta de atender a todas as demandas de uma sociedade complexa como a nossa. Os partidos não canalizam as forças que fermentam na sociedade, apenas representam interesses, especialmente das classes poderosas. Se não resolvermos o grave problema da injustiça social que afeta grande parte da população, teremos que conviver permanentemente com a violência. A violência das ruas e das comunidades carentes das periferias ou morros é violência segunda, fruto da violência primeira que é a forma como se organizou a sociedade ao redor de privilégios e não de direitos, excluindo grande parte da população do contrato social e dos benefícios mínimos de uma sociedade humanizada com saúde, educação, moradia, trabalho e segurança. Enquanto não se fizer uma reforma agrária integral, as cidades continuarão inchando por aqueles que não aceitam mais viver miseravelmente no campo, sem terra, sem assistência e sem salários decentes.
EP - Ainda é possível que a humanidade reencontre a sacralidade e o verdadeiro sentido da da vida? A cultura da superficialidade é uma ameaça?
LB - O ser humano é um projeto infinito. Ele é devorado por duas fomes: a de pão - que é saciável - e a de beleza, de comunicação, de felicidade e de transcendência - que é insaciável. O sentido da vida se encontra no equilíbrio destas duas fomes. Ocorre que a nossa cultura é materialista, pois só se concentra no pão e seus derivados, que é a acumulação de bens materiais, sempre de forma perversa, muitos bens para poucos e poucos bens para muitos. Precisamos dar centralidade à gratuidade da vida, à amizade, à convivência fraterna, ao amor, à alegria, à busca sensata da felicidade, ao viver mais com menos. Esses valores não têm preço e não se encontram no mercado, nem nas bolsas nem nos bancos. Mas se encontram no coração, lugar das excelências, daquilo que vale a pena e nos pode fazer felizes.
EP - Sua trajetória intelectual evoluiu sempre ao lado de uma postura política firme. Pretende apoiar a senadora Marina Silva, caso seja candidata à presidência da república?
LB - Marina Silva é uma antiga amiga desde os anos 70 quando ia, durante 10 anos, todos os janeiros e julhos ao Acre para acompanhar as comunidades eclesiais de base e os povos da floresta junto com Chico Mendes, Marina Silva, Jorge e Tiao Viana e outros. Sei de sua trajetória heróica e de sua determinação de mulher amazônica, de seu compromisso pela vida, pela questão dos desmatamentos, dos climas, das florestas, dos povos humilhados. Marina Silva é uma causa. O mais importante é que a partir de agora ela irá levar para a sociedade a bandeira da ecologia, não apenas da ecologia ambiental, mas também da ecologia social que tem a ver com a superação da miséria do povo, da ecologia mental, suscitando novas mentes novos corações para enfrentarmos os desafos da atual situação global. Seguramente seu mérito será obrigar todos os partidos a assumirem a agenda ecológica, do aquecimento global e de um desenvolvimento possível dentro dos limites da Terra e dos ecossistemas. Se for candidata a apoiarei, pois ela está à altura dos atuais desafios e tem a postura certa que beneficiará nosso pais e a inteira humanidade.
EP - Qual é sua expectativa em relação aos jovens?
LB - Eu acredito que a salvação vem de baixo, dos jovens, daqueles que ainda são portadores de sonhos, daqueles que não se resignam a apenas consumir e a ser meros reprodutores do sistema perverso imperante, mas exercitam a fantasia, criam coisas novas e ensaiam um novo modo de habitar este pequeno planeta com respeito, com trabalho não destrutivo da natureza, com sentido de solidariedade universal e com amor à Terra, nossa Mãe. É por eles que passa o novo e aquilo que deve ser. E o que deve ser tem força.
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